domingo, 26 de abril de 2015

VERITAS



A verdade não libertará!
-Conspiração estúpida, teoria inútil para delírio de loucos

Em tempo hábil, notícias falsas viram manchetes fáceis
digestivas
E a verdade dorme toda encolhida
sob lençóis
As vezes aparece, encalhada numa praia, 
em classificados
num site
num sítio do interior
Então é esfolada viva, até virar mentira
Motivo de riso, foco desviado
- fotografam sempre seu melhor lado-

Relativa, manipulada, instituída
A verdade vibra sob arquibancadas,
pulsa calada em bastidores e repartições
A verdade é uma espinha de peixe na goela do engasgado
Não passa na alfândega
É pouco usada, é proibida, ultrapassada
Para ela, a melhor mordaça

A verdade não é servida no café da manhã
Quem ousar dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade
Terá sua língua arrancada
E exibida ao mundo
Em tempo real.
 



 

segunda-feira, 13 de abril de 2015

ONTEM



Sonego os verdes da tarde de inverno
Deixo mofar o tempo na última gaveta
Confundo horas, séculos, frases

Os olhos insossos se limitam à moldura
Fastio de viver

Lembro altares antigos, ruas, utensílios
Sinto uma saudade imprecisa dos monóculos
Deixo planar imagens
Grilo na grama regada
E folhas avulsas
Desenhadas com hidrocor


quinta-feira, 9 de abril de 2015

SOMA



A casa é o cosmo
Abrigo de ócios
e malabares
O lixo, a louça, a falta
Rachadura nova
Morcego
Janela que não trava

De noite o chão da sala apruma as costas
Luz de vela
Teatro de sombras, medos antigos, mantimentos
Canteiro de obras
Aproveitamento de sobras

A casa me habita
é órgão recente:
Implantado.



foto: Mery Lemos

sexta-feira, 3 de abril de 2015

ARESTA 

No sólido geométrico com quinas de papelão 
O dentro a dentro 
não cabe o pulso 
O dia a dentro 
não sabe o quanto 
O espaço pouco 
 não cabe o sopro 
ferve 
cansa 
desiste 
encolhe os ombros:
origama-se.


segunda-feira, 30 de março de 2015

O mundo tem miopia
Eu enxergo mal na luz do dia
As coisas têm mistérios
Eu, descrenças.

Aviso: não é possível fotografar o volume da minha gargalhada
todos os dias distribuo à multidão esfomeada
cinco pães e duas alegrias

tenho precisado andar sobre as águas
e ando
acreditando mais em pedras que em profundezas.








quarta-feira, 7 de março de 2012

foto: Mery Lemos

VEZES

Houve dias de perder de vista
e esquecer o custo
Houve dias de sair da rota
e lavar os muros

Algumas vezes
tecia a trama
Perfurava os pulsos
sem optar

Entre os lábios acesos:
Açúcar e sal.

(Ezter Liu)

domingo, 6 de novembro de 2011

foto: Mery Lemos

SECO

Carnes duras na manhã de cimento
pés descalços
com a fome de todos os dias
sem a euforia necessária ao grito
Tudo se cala
somente o silêncio de um urubu
em móbile de fios de nylon
Nesse céu de sabão em pó

(Ezter Liu)

terça-feira, 17 de maio de 2011

foto: Mery lemos